Não se encontra nenhum vestígio na América de um homem de época primitiva comparável ao Pitecantropo, ao Sinantropo ou ao Neandertal. Os esqueletos humanos mais antigos quase não se distinguem dos de índios modernos. Mas podemos dizer que um número considerável de descobertas vêm comprovando a contemporaneidade na América do homem e de uma fauna extinta há várias centenas de milhares de anos. Apenas para lembrar, podemos mencionar um mastodonte do Equador, no meio de um fogão que encerra fragmentos de olaria, e os ossos de mastodonte novo ao lado de um crânio de cavalo fossilizado e de um esqueleto humano na caverna Confins, no Brasil. Em Folson, no Novo México, encontraram-se restos de um bisão fóssil associados a pontas de pedra; em Russel Springes, no Kansas, uma ponta de sílex na omoplata de um bisão. Há alguns anos, foi dado a conhecer um crânio humano em Tepexpan, no Vale do México, na mesma camada que os restos de um elefante. Esta escavação foi recentemente confirmada pela descoberta no mesmo terreno de um esqueleto de mamute, no qual estavam fincadas várias pontas de sílex e de obsidiana. Na Lagoa Santa, no Brasil, onde 800 cavernas foram exploradas, encontraram-se ossos de uma fauna fóssíl associados a restos humanos. Pareceria, portanto, que a antiguidade do homem americano não é inferior em nada à do homem das outras partes do mundo.
Mas também é bastante provável que algumas das espécies pré-históricas mencionadas tenham existido na América até mais recentemente que no resto do mundo. O bom estado em que foi encontrada a pele da grande preguiça da caverna Eberhart, no extremo-sul da Patagônia, a conservação de seus excrementos, parecem confirmar tal tese.
Há um acordo geral em admitir que o povoamento da América aconteceu por imigração. Mas não há consenso sobre a origem dos imigrantes. Uns lhes atribuem uma origem comum, outros imaginam de preferência movimentos de populações convergentes mas oriundos de ontos diferentes, que se teriam produzido senão contemporaneamente, pelo menos em vagas sucessivas.
A configuração muito especial do Novo Mundo torna seu acesso difícil. A única passagem relativamente franca é o estreito de Bering e o rosário das Ilhas Aleutas, por onde a América se aproxima bastante do continente asiático e parece que a grande maioria dos imigrantes seguiram esta rota. Quando a pré-história da Sibéria for mais bem conhecida, é provável que nela encontremos os vestígios de sua passagem.
Estamos autorizados a supor a existência de diversas vagas de migrações provenientes da Ásia. Uma teria trazido humanos para o sul, da Patagônia até o Brasil. Outra teria trazido outros humanos, de pequeno porte e com maçãs do rosto salentes. Uma terceira vaga trouxe humanos de alto porte, que encontramos hoje entre as populações da América do Norte. Os esquimós, finalmente, são os tipos mais mongolóides da América. Certamente, grande número de povos da América possuem caracteres mongolóides bem marcados, maçãs salientes, cor escura dos cabelos, dos olhos, tez moreno-amarelada ou moreno-cobre. Mas outros elementos mongóis - como os olhos puxados e o nariz arrebitado - quase não se encontra na América. Por outro lado, observa-se ai traços não asiáticos devido provavelmente a contribuições diferentes.
Paralelamente aos antropólogos, os linguistas participaram das pesquisas sobre o povoamento das Américas. Em nenhuma parte do mundo existem tantas línguas diferentes como em nosso continente. Elas se dividem em determinado número de famílias linguísticas sem que fosse possível chegar a um resuultado plenamente satisfatório. Inumeras língaus não se localizam em parte alguma! Distinguem-se, atualmente, entre 120 e 150 dessas famílias, das quais algumas têm uma irradiação imensa. Mas, os desvios no interior de cada uma delas são por vezes tais que pessoas que falam duas línguas diferentes de uma mesma família não se compreendem.
Concordâncias estruturais foram constatadas entre certas línguas norte-asiáticas e americanas, mas elas não se estendem ao vocabulário. Em compensação, existem semelhanças léxicas entre a família Hoka e o malaio-polinésio e entre as línguas Con e o Australiano. Essas semelhanças levaram o Dr. Rivet a concluir que há uma interpenetração dessas línguas americanas de um lado e do malaio-polinésio e do australiano do outro. O que implicaria, numa época mais ou menos longuíqua, em intercâmbio entre a América e a Oceania e, talvez, um deslocamento de população da Oceania em direção à América.
Entre as mais antigas manifestações do homem na América do Sul conhecemos a indústria lítica pré-cerâmica no norte da Colômbia, em São Nicolau de Bari, no curso inferior do rio Sinu, assiam como na Venezuela, no sítio El Jobo. Essa última parece remontar a 16.000 anos antes da nossa era.
Na Patagônia, uma escavação nas cavernas Palli Aike e Fell, perto do Estreito de Magalhães, encontrou cinco camadas superpostas de habitat; a mais profunda contém restos de guanacos, de preguiças gigantes e de cavalo selvagem, associados a uma indústria lítica de pontas de azagaias e de raspadores de feitura bastante rude, utensílios de osso e de objetos cilindróides em lava. Restos humanos estavam incinerados, mas foi possível reconstituir um crânio que lembra um pouco o tipo de Lagoa Santa, no Brasil.
Escavações em Kjökkenmöddings, no Canal de Beagle, revelaram a presença antiga de uma população de pescadores que fabricavam facas de conchas, pontas e arpão dentadas e colares de ossos de pássaros. Outros pescadores instalaram-se nas costas do Chile perto de Arica e Taltal, onde se pode observar dois períodos diferentes de ocupação.
Os primeiros povos cujos vestígios foram descobertos na costa do Peru praticavam uma agricultura rudimentar; por esse motivo pensa-se que talvez fossem contemporâneos dos povos ceramistas de outras regiões. Até o presente, localizaram-se cinco povos sem cerâmica na costa peruana: em Puemape, perto de Pacasmayo, em Milagro e em HHuaca Prieta, no vale de Chicama, em Cerro Pietro, no vale do Viru e em Aspero, no vale do Supe.
Huaca Pietra é o local mais bem conhecido. A população devia ser bastante densa. As habitações, encostadas em grandes blocos de pedra, eram semi-subterrâneas. A alimentação compunha-se principalmente de peixe e de moluscos; a coleta de certas plantas selvagens complementava-a, assim como algumas culturas: achira (espécie de tubérculo), cabaceiros, feijões, pimenta, lucuma (fruto). O cozimento dos alimentos fazia-se com a ajuda de pedras aquecidas: colocava-se a peça a ser cozida diretamente sobre a pedra ou, então, introduziam pedras quentes numa cuia cheia de água. Esse sistema de cozimento conservou-se mesmo depois da introdução da cerâmica. Sabe-se, ainda, que cultivavam algodão, com o que teciam suas redes de pesca. Fiavam sem fusos. A verdadeira tecelagem era ainda muito rara, mas eles confeccionavam vestimentas com casa de árvore bastida, empregavam raspadores e facas de sílex obtidos por percussão, pesos de redes perfurados e agulhas de ossos. Os mortos eram enterrados em simples fossas; mais tarde construíram túmulos curvos utilizando blocos de pedra rolados.
Entre esses primeiros habitantes e aqueles que construíram as grandes civilizações pré-colombianas, sucederam-se inumeráveis gerações. Milhares de anos de estabelecimento no lugar foram necessários para criar um terreno propício ao desenvolvimento dos diferentes estilos, cujos vestígios ainda hoje admiramos.
Baseado em texto de Henri Lehmann
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