Nós, os
Governos dos Povos, Nações e Organizações Indígenas da América do Sul, da
América Central, da América do Norte e do Caribe, no exercício de nosso direito
à livre determinação e em defesa da Mãe Terra, proferimos juntos a palavra.
CONSIDERANDO
1. Que o
modelo de desenvolvimento econômico implementado pelos Estados do continente
americano desconhece nossa realidade e nosso próprio desenvolvimento; omite o
reconhecimento de Bem Viver, o equilíbrio e a harmonia de nosso ser indígena
com a Mãe Terra.
2. Que as
políticas estatais de mitigação e redução dos impactos da mudança climática têm
resultado ineficazes e têm evidenciado seu fracasso, promovendo a
mercantilização do ambiente.
3. Que a
adoção e a implementação da Declaração
Americana dos Direitos dos Povos Indígenas deve ser um compromisso dos
Estados para deter o etnocídio de nossos povos.
4. Que a
folha de coca tem um caráter sagrado, milenar e cultural e é alimento material
e espiritual para nossos povos.
5. Que se
deve garantir o exercício da livre determinação de nossos povos e fortalecer
nossa qualidade de Governos Próprios nas instâncias internacionais.
6. Que os
Estados Americanos medem a iniquidade social e/ou a prosperidade dos Povos
Indígenas através de indicadores e metas generalizadas e não através do
exercício efetivo de nossos direitos reais sobre os territórios ancestrais,
impedindo o dever de protegê-los, respeitá-los e salvaguardar a Mãe Terra como
sujeito de direitos.
7. Que a
integração regional deve consolidar-se como um espaço de reconhecimento e
respeito a nossos povos ancestrais, bem como a superação da iniquidade social e
de toda prática colonialista nas relações entre os Estados e entre esses e os
povos.
DECLARAMOS
aos chefes de Estado da região, reunidos nos dias 14 e 15 de abril de 2012, na VI
Cúpula das Américas, realizada em Cartagena de Índias, Colômbia, o seguinte:
I. Frente
ao modelo de desenvolvimento econômico:
1. Este
foi reduzido à intervenção e ao despojo ilegítimo de nossos territórios, bem
como à superexploração dos bens naturais que conservamos milenarmente,
submetendo-nos inevitavelmente ao genocídio e ao extermínio.
2.
Afirmamos que a superação da iniquidade social de nossos povos deve ser
alcançada através da adoção e da implementação de instrumentos jurídicos e de
políticas públicas que nos protejam e garantam o exercício de nossos direitos,
prevenindo potenciais vulnerações, a devastação de nosso território, bem como
tudo o que ponha em risco nossa sobrevivência física e permanência cultural.
3. A
integração regional deve superar a perpetuação da intervenção econômica,
política e social em nossos territórios.
II.
Frente à mudança climática
1. Dado o
caráter de ser vivo que tem a Mãe Terra, existe a necessidade de implementar
nossas contribuições e práticas milenares que mitigam e reduzem os impactos do
fenômeno da mudança climática.
III.
Frente à Declaração Americana dos Direitos dos Povos Indígenas
1.
Requeremos um compromisso serio e respeitoso por parte dos Estados dirigido a
fortalecer econômica e politicamente o processo de concertação com as
autoridades e organizações representativas dos povos indígenas da região que
permita adotar e implementar ao término de um ano esse instrumento jurídico e,
consequentemente, que se cumpra com os deveres e obrigações que, por natureza,
são inerentes aos Estados. Manifestamos nossa preocupação com a decisão de
países como Estados unidos e Canadá de retirar-se do processo de negociação,
colocando em risco o consenso e os acordos já celebrados em 13 anos de
negociações.
2.
Respeitar o princípio de progressividade dos direitos e abster-se de incorporar
na Declaração Americana de Direitos dos Povos Indígenas disposições regressivas
e ter como padrão mínimo para as negociações a Declaração das Nações Unidas
sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Instamos a fomentar o diálogo e não
fechar os canais de comunicação sobre os eixos fundamentais para a proteção dos
povos indígenas.
IV.
Frente ao Direito à livre determinação e ao reconhecimento de Governos Próprios
dos Povos Indígenas.
1.
Implementar um espaço de diálogo e de articulação permanente e horizontal
dentro da estrutura da OEA, com o fim de garantir a consolidação dos princípios
democráticos dentro da organização. Essa instância deve avançar na
implementação e seguimento das políticas governamentais que atinjam aos povos
indígenas bem como avaliar a continuidade dos acordos celebrados entre os
Estados e os indígenas do continente, como também as decisões tomadas no marco
do Sistema Interamericano de Direitos Humanos.
2.
Respaldamos todos os processos de consulta aos povos indígenas no marco do
Convênio 169, da OIT.
3.
Despenalizar o consumo da folha de coca em seu estado natural por ter caráter
sagrado, milenar e cultural e é alimento material e espiritual para nossos
povos.
4. Que os
governos das Américas contribuam à democratização da palavra e de suas
estratégias de comunicação próprias, mediante a abertura e a execução conjunta
com organizações indígenas, verdadeiras políticas públicas diferenciais no tema
da comunicação indígena. Legitimar o mandato da Primeira Cúpula Continental de
Comunicação Indígena de Abya Yala, realizado em Cauca, Colômbia, como guia para
os planos estratégicos dos povos e Estados no tema da comunicação diferencial.
V. Frente ao
Sistema Interamericano de Direitos Humanos.
1. Instamos aos órgãos de proteção do Sistema
Interamericano (Comissão e Corte Interamericana de Direitos Humanos) a proteger
os direitos dos povos indígenas, em consonância com os instrumentos
internacionais de proteção de direitos humanos, onde deverá primar a proteção
dos povos indígenas acima da execução do modelo de desenvolvimento econômico
extrativo e de desterritorialização adiantado pelos Estados da região.
2. Convocamos aos Estados a reconhecer e
aplicar os mandatos do Sistema Interamericano.
VI. Frente aos
Direitos Humanos:
1. Solicitamos aos Estados que, frente à
existência de qualquer conflito, primem as soluções políticas; nesse sentido,
instamos ao Estado colombiano a gerar todas as condições no que seja de sua
competência, para buscar uma solução política ao conflito armado que nos
atinge, do contrário, se perpetuará o extermínio ao qual atualmente estão
submetidos nossos irmãos colombianos.
2. Exigimos respeito dos Estados para com
nossos territórios e a nós mesmos, em razão da campanha de militarização e de
criminalização a que somos submetidos na região.
3. Convidamos à adoção de uma Convenção
Americana que proteja real e efetivamente o direito ao Consentimento Prévio,
Livre e Informado. Esse instrumento jurídico deve ser respeitado pelos Estados
em consonância com o caráter de direito humano do mesmo e seu conteúdo
indivisível com a existência dos povos indígenas.
4. As políticas desenhadas para proteger e
implementar os direitos dos povos indígenas devem ser construídas de maneira
concertada e garantir seu enfoque diferencial.
5. Colocar todos os esforços para a proteção
das crianças, das mulheres e dos jovens indígenas.
6. Consolidar a segurança jurídica dos
territórios indígenas, ratificar nossa ocupação e posse ancestral, bem como
garantir o gozo efetivo do direito à propriedade territorial.
Recomendamos
Apoiamos da demanda marítima da Bolívia e instamos aos Estados
envolvidos a encontrar soluções definitivas o mais breve possível, no marco da
integração regional para o Bem Viver e para a prosperidade de Abya Yala
(Américas).
No marco de integração dos povos, especificamente dos indígenas e sendo
2012 o ano de reencontro, de reconciliação, de novos tempos, sugerimos que a
República irmã de Cuba possa participar da próxima Cúpula das Américas.
Finalmente, mantemos nossa disposição de continuar fortalecendo os
processos democráticos e de diálogo na região, considerando que, enquanto os
Estados do hemisfério manifestem sua vontade política e avancem na construção
de vias de discussão, nossos Governos Próprios caminharão rumo a construção de
um Tratado de Direitos dos Povos Indígenas que ratifique nossos direitos milenares
e fortaleça nossas alianças em defesa da Mãe Terra.
Com o propósito de fortalecer nossa integração e unidade, adicionalmente
decidimos constituir o Conselho das Organizações Sociais dos Povos de Abya Yala
(Américas).
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