terça-feira, 10 de novembro de 2009

TAPEPUKUS, TAPIRAPÉS E PEABIRUS

Quando os europeus invadiram a América, encontraram um imenso território já civilizado, ao contrário do que comumente se diz.

A civilização americana era representada por centenas de nações indígenas, com características diversas, fecundas e valiosas. Em selvas, montanhas, campos, geleiras, pântanos e litorais, estavam os INCA do Peru; os ASTECA do México; os TUPI e do Brasil; os CHIBCHA da Colômbia; os MAIA-QUICHÊ do México e Guatemala; os GUARANI do Brasil, Paraguai, Bolívia e Argentina; os MAPUCHE do Chile; os SIOUX e APACHE dos Estados Unidos, e muitos outros.
Eram autores do mais perfeito calendário da humanidade (Maia); detentores do mais vasto conhecimento de medicina fitoterápica do mundo (tupi e guarani); conhecedores do avançado conceito matemático do zero (Olmeca e Asteca) mil anos mais cedo do que no Egito, Índia e Europa; descobridores da relevância das manchas claras e escuras da Via Láctea para o saber astronômico (Guarani e Inca); artífices de irrigação artificial e técnicas de recuperação de desertos (Chimu); de engenharia única para a construção de cidades flutuantes (Uru); idealizadores do conceito arquitetônico de apartamentos (Chaco), tendo construído em Pueblo Bonito, no Novo México, uma espécie de condomínio planejado que foi o maior dos USA até o século XIX; descobridores do efeito das lunações sobre as marés (Tupi e Guarani), que o europeu Isaac Newton só constataria em 1687. Construtores da gigantesca Tenochtitlan (Asteca), a maior cidade do mundo no século XVI, com seus 1 milhão de habitantes e infraestrutura de alta qualidade. Praticantes de cirurgia cerebral; mumificação; arquitetura peculiar contra terremotos; técnicas de estatística avançadas (não praticadas na Europa da época); sistema eficiente e veloz de correios, desconhecido pelos europeus; extensa rede de estradas só comparável ao Império Romano, porém com canaletas de água potável e fresca ao longo de todas elas, bem como árvores frutíferas nas laterais, sem falarmos da higiene e da saúde – enquanto a Europa de 1500 enaltecia o hábito de não banhar-se e convivia-se com ambientes fétidos, bocas negras de cáries e pestes sucessivas, boa parte dos nossos índios praticava a faxina doméstica e externa, a limpeza dentária e o banho diário, até mesmo nas regiões mais frias.

Ao pisar no Novo Mundo, um dos primeiros fatos que os europeus descobriram foi que a costa marítima, de norte a sul, do Canadá ao Uruguai, era dotada de CAMINHOS. Mais tarde verificaram que esses existiam também no interior, cruzando o território em todas as direções.

Uns eram simples trilhas, provavelmente originadas por animais em busca de alimento e água, que foram reaproveitadas pelos índios para seu uso. Outros eram verdadeiras estradas, com pavimento e recursos sofisticados, que causaram impacto nos invasores. As nações iroquesas, por exemplo, possuíam uma rota terrestre e fluvial entre o Canadá e o nordeste dos Estados Unidos. Só o trecho terrestre somava cerca de 2.000 quilômetros. A ESTRADA NATCHEZ, construída por indígenas mississipenses (EUA), com cerca de 700 quilômetros, ligava a atual cidade de Natchez a Naschville, no Tennessee.

As mais notáveis vias de comunicação indígena do continente norte-americano ficam no México. E são antiqüíssimas. Entre 1200 a.C e 400 a.C., muito antes das famosas estradas astecas, o povo Olmeca, da área central do golfo do México, abriu uma ampla rede, com aproximadamente 1.600 km. Começava nas imediações de San Luiz Potosi, ao norte da atual capital mexicana, atravessava o país, descia pela Guatemala, El Salvador, Nicarágua e ai dar na Costa Rica. E acordo com os arqueólogos, os caminhos olmecas seriam primordialmente de comércio de matérias primas que faltavam em sua região, particularmente o basalto e a obsidiana.

Séculos mais tarde, o povo Asteca instituiu uma estrada conhecida como POCHTECA. Uma via comercial, de deslocamento militar e de cobrança de impostos, que partida da populosa cidade de Tenochtitlán para todas as direções do império, indo, ao norte, até Oxitipán e, ao sul, até Chiapas, fronteira com a Guatemala. A oeste, ia até Michoacan e, a leste, até Vera Cruz.

Na América do Sul, bem irrigada por rios, teve milhares de rotas fluviais. Mas as rotas terrestres também eram abundantes. Muitas eram aquelas trilhas de animais aproveitadas pelos indígenas. No Brasil eram chamadas de TAPIRAPÉS – caminhos do tapir ou anta. Outras foram abertas pelos próprios indígenas para atividades variadas, tais como plantar, caçar, pescar, coletar vegetais, mineirar, comercializar, guerrear, levar mensagens ou simplesmente se comunicar com aldeias de parentes e de outros povos. Algumas possuíam uma importante função espiritual-religiosa, como estradas para visitar locais sagrados, homenagear os Deuses e ancestrais, buscar o paraíso, etc.

Os caminhos terrestres abundavam mesmo na selva amazônica e Alto-Xingu. Os Kuikuro possuíam estradas, pontes e praças interligando suas aldeias, construídas entre 1250 d.C e 1600 d.C. Os Tupinambá do século XVI tinham caminhos que iam do Rio de Janeiro à Bahia, mais de trezentas léguas.

Mas de todas as vias citadas nos relatos dos invasores e colonizadores, as mais impressionantes são, sem dúvida, as estradas incas. No eixo principal (sul-norte) tinha 16.000 quilômetros, entre Chile, Peru, Equador e Colômbia. Nos secundários, outros milhares unido o Oceano Pacífico (oeste) à Argentina e Bolívia (sudeste e leste), somando 40.000 quilômetros.

Integrando-se a essa rede, o PEABIRU é uma estrada interoceância, ligando o Atlântico (litoral de Santa Catarina e São Paulo) ao Pacífico (litoral do Peru e Chile), 1000 anos antes da chegada de Colombo. Boa parte da América do Sul é um legado desse caminho, com um trajeto aproximado de 4.000 km (3.800 km até o litoral do Peru ou 4.300 até o litoral do Chile). Sua linha sudeste-noroeste acompanhava o movimento aparente do Sol, nascente-poente.

Muitas vezes identificado pelos guarani como sendo um TAPEPUKU (“Caminho Comprido”), faz referência geográfica e espiritual às danças guarani em busca da Terra sem Males, localizada no oceano e procurada no leste e no oeste da América do Sul. Ou seja: no Atlântico e no Pacífico.

Baseado no texto de Rosana Bond

Um comentário:

  1. Impressionante a tua colocação, e forma tão clara e concisa.
    Olha que tenho lido coisas a respeito, mas o que
    dizes é realmente interessante.
    Falas do litoral de SC, mas sabes o local ou área?
    Grato e parabéns,
    Roberto.

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