domingo, 3 de outubro de 2010

COCAR... signo violentado


A mídia seqüelada de Manaus publicou, hoje dia 5, com ostentação, as imagens do presidente da CBF, Ricardo Teixeira, e de um representante da FIFA, cada um com um cocar na cabeça. Lógico, que alguém do governo estadual deve ter realizado a violenta prática, já que as duas figuras não iriam por livre e espontânea decisão configurar as imagens violentadoras. Não que ambas sejam antropologicamente cônscias da violência, mas por que executando tal ato estariam, de uma certa forma, mostrando claramente tendência à favor de Manaus como sede escolhida para copa de 2014. O que implicaria atrito com as outras duas capitais: Belém, forte concorrente, e Rio Branco, também disparada em relação à Manaus. E como Ricardo Teixeira se mantém na presidência da CBF por conluios com presidentes de Federações, não jogaria contra si mesmo.

O que evidencia a estupidez de uma sujeito é sua limitação para discernir o que existe além de sua realidade. Para este sujeito o mundo fora de si é pura abstração: não se concretiza como autônomo, independente. E quando trata-se de relações culturais aí que a impossibilidade de discernimento se mostra mais real.

O não estúpido sabe que a cultura de uma povo é o produto das experiências deste povo transformadas em sentidos e representações como expressões de sua identidade. Todos os corpos matérias e imateriais que compõem sua cultura foram produzidos nos processuais de seus percursos empíricos. Nenhum objeto material ou imaterial nasceu como supérfluo, como ocorre na sociedade da opulência do capitalismo consumista, como fala o filósofo Marcuse.

O colere, o signo etimológico latino de onde se origina a palavra cultura, demonstra que toda produção é um ato de cultivar a vida como afirmação para a habitação do homem. Assim o índio não criou nenhum objeto fora de sua realidade ontológica. Todos os objetos de seu inventário cultural carregam a força afirmadora de seu habitat como vida. Por isso, ao contrário do que imagina, e exibe, a estúpida consciência branca, um cocar é um signo transportador de força afirmativa da cultura indígena. Nunca um adereço alienado de sua realidade como quer a consciência branca que o reificou em peça de museu-turístico para ser usado como mercadoria de sedução para tocar o capitalismo, no caso, a FIFA e a CBF. Um cocar não é signo desativado da vida, como qualquer bijuteria da cultura fetichista branca que serve aos seus propósitos vazios. Um cocar é real atuação indígena. Nunca glamour sem causa social.

Desta maneira, o que se depreende desta violência cultural é que um governo que faz uso e abuso desta discriminação não pode jamais enunciar que está preocupado com a cultura indígena como é alardeado. Mormente, agora que o governo federal põe em prática uma política ligada a preservação não só dos territórios indígenas como também a valoração de sua cultura.

Com a palavra contestatória os próprios índios e os antropólogos das instituições, principalmente da UFAM. Mas nada dos ‘antropólogos’ saudosistas da hippielândia. Estes são tão branquelos como o “funcionário” do governo que usou o cocar como signo violento de sedução.

E mais, o futebol que o índio sempre jogou não tem semelhança com o da FIFA,CBF, mídia, e muitos menos dos governos telúricos.


Texto publicado no blog AFINSOPHIA – Associação Filosófica Itinerante.

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