PARACAS é uma cidade do atual departamento de Ica, na costa peruana, aproximadamente a 250 km ao sul de Lima.
Frederic Engel descreve sua paisagem como:
“Um mundo vermelho, cinza, amarelado e turquesa, tal parece Paracas, com suas colinas, suas extensas áreas arenosas e sua baia de frente para a imensidão do Pacífico. Quando o sol se põe e reflete na areia cinzenta, se pode perceber, escondidas debaixo da areia branca,restos do cemitério daqueles homens que nos deixaram uma recordação inolvidável: os célebres 'tecidos de Paracas', cheio de cores, de vida, de magia, com testemunho de sua relação com essa enigmática baía. Aqui onde nunca chove, onde os ventos sopram formando 'chuva de areia', a natureza conservou, quase intacto, o milenar mundo da Baia de Paracas”.
O nome PARACAS significa, segundo alguns investigadores, “chuva de areia”, enquanto outros dizem ser “testa alta”. Na verdade, as duas acepções estão certas: os ventos, carregados de areia, são característicos dessa região e, por outro lado, as múmias descobertas têm uma testa achatada e alongada artificalmente.
A região de Paracas corresponde ao complexo agrícola mais antigo do qual se tem conhecimento no Peru. As datações através do carbono 14, demonstram que os “paraquenhos” conheciam o cultivo de plantas há mais de 9.000 anos. Cerca de 6.000 anos atrás, produziu-se um fenômeno climático que elevou uns 30 metros o nível do mar, chegando – por volta do ano 3.800 a.C. – a 3 metros acima do nível atual. Esse fenômeno de trasngressão marinha criou novas praias e destruiu outras. É interessante assinalar que quando o nível do Pacífico alcançou o nível atual – há 6000 anos atrás –, numerosos grupos de agricultores e pescadores apareceram na costa. Paracas é um desses grupos, surgido em torno de 3.100 a.C.
Paracas foi descoberta por J. C. Tello, em 1958, ao escavar um antigo cemitério onde encontrou uma grande quantidade de crânios estranhamente achatados. Junto dos esqueletos, encontrou utensílios do dia-a-dia desse povo – flautas, punhais de osso, agulhas, balas redondas de madeira polida, dados retangulares de quartzo e representações de animais de palha e junco. Segundo a datação por carbono 14, a cerâmica e a cultura do milho aparecem entre os anos 2.000 e 1.500 a.C.
As tumbas desse período eram escavadas no solo, com a forma de um grande frasco: “A tafera é dura debaixo do sol abrasador. Uma vez retirada a capa de areia, aparece outra de salitre; depois dessa, surge a boca de um poço vertical, escuro e profundo, quase circular, cujas paredes são revestidas de pedras, algumas salientes formando um tipo de escada. O poço tem a profundidade de 2 metros, por 1.50 m de largura, terminando na entrada de uma caverna propriamente dita com cerca de 3 a 4 metros de diâmetro por 2 a 5 metros de altura.Trata-se de uma gruta artificial, escavada na rocha, contendo fardos funerários revestidos com uma terra pegajosa. Em seu conjunto, a sepultura, incluindo o poço de aceso, é semelhante a uma taça invertida ou um frasco. O interior é escuro, mas os poucos raios de sol que se infiltram pela entrada permite ver o solo dividido em vários compartimentos, nos quais estão colocados os fardos funerários”.
A cerâmica encontrada junto é policrônica com uma pintura resinosa nas cores amarelo, verde, vermelho e preto, com motivos geométricos e, em alguns casos, a estilização de figuras felinas ou de pássaros (que recortam o estilo Chavin).
A mumificação seguia uma técnica muito elaborada. Primeiro, o morto era embalsamado; através de cortes verticais se tirava a massa muscular e adiposa das pantorilhas e coxas; outros cortes permitiam tirar o coração, os pulmões e a traquéia, todo o aparelho digestivo e, por fim, os olhos e cérebro. Supõe-se que em certos casos o cérebro era extraído pelas fossas nasais. Depois de estar esvaziado, era colocado sobre areia quente ou próximo a brasas incandescentes para fundir a gordura restante, diluindo os tecidos graxos. Depois de toda essa operação, a pele descolada e flácida, e com uma coloração especial, torna-se pergaminosa, enrolando-se firmemente ao redor dos ossos, fazendo o morto parecer muito mais velho do que realmente era.
Depois disso, o corpo era amarrado com força para impor-lhe a posição fetal, fazendo-o parecer sentado, abraçando as pernas e as mãos sustentando a cabeça. A imagem resulta impressionante: é a morte liberada da putrefação cadavérica!
Muitas das múmias encontradas mostravam marcas TREPANAÇÃO em suas cabeças deformadas. Acredita-se que estejam ligadas à ferimentos de combate. Com efeito, os grossos turbantes de algodão não conseguiam minimizar, sempre, os golpes de maça d
e pedra estrelada. A ineficiência do turbante provocava afundamentos e rachaduras no crânio, provocando a paralisia parcial ou total da pessoa, além de perder a consciência por um tempo indeterminado. A trepanação surge como tratamento para esses males. O cirurgião abria o couro cabeludo e cortava a carne ao redor do ferimento, usando uma faca de obsidiana, até chegar ao osso quebrado. A anestesia devia existir, pois essa é uma operação delicada e o paciente precisava ficar totalmente imóvel; provavelmente, usava-se a coca. Quando chegava no osso, fazia-se um corte nele; depois, mais um paralelo e dois perpendiculares, formando um quadrado ou retângulo ao redor do tecido ósseo deteriorado. Então, esse pedaço era cuidadosamente retirado. Feito isso, recolocava-se a carne e o couro cabeludo no lugar, e fechava-se com um curativo de ervas que agilizavam a cicatrização. Caso o pedaço ósseo retirado fosse muito grande, podia-se usar um tampão metálico em seu lugar, debaixo do couro cabeludo. Essa operação aliviava a pressão sobre o cérebro, trenando o hematoma que se formara com a pancada e que deixava a pessoa com paralisia.
A prática da trepanação em Paracas parece não ter sido mais desenvolvida que em qualquer outro lugar do mundo. A contar pelo calo ósseo encontrado nas bordas da abertura de 90% dos crânios trepanados, o índice de morte durante a operação (ou logo depois dela) é muito pequeno. A criação do calo demonstra que o paciente sobreviveu tempo suficiente para o osso cicatrizar; em alguns casos, os calos demonstram anos. Nos casos em que usaram a placa metálica em substituição do tecido ósseo retirado, os pacientes viveram o suficiente para o osso se soldar ao metal, tornando-a firmemente ajustada e imobilizada.
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