sábado, 18 de agosto de 2012

BELO MONTE PAROU!

Foto de Paulo Fradinho

Em decisão histórica, a 5ª turma do Tribunal Regional Federal da 1ª região (TRF1) decidiu, por unanimidade, pela suspensão das obras da hidrelétrica no Rio Xingu (PA). A medida foi tomada após o tribunal julgar recurso de embargo do Ministério Público Federal que pedia a revogação da licença ambiental da megausina pela falta de consulta prévia aos povos indígenas.

O desembargador federal Souza Prudente, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), anunciou na terça-feira (14) a paralisação imediata das obras de Belo Monte. A decisão foi tomada na noite anterior (13), pela 5ª turma do TRF1, ao julgar recurso de embargo do Ministério Público Federal sobre a falta de consulta prévia aos povos indígenas para liberação da obra. 

A ação data de 2005, quando o Congresso Nacional, sem ouvir nenhuma das comunidades afetadas, e sem se basear em nenhum estudo que apontasse as possíveis consequências da obra, autorizou a construção da usina. A mesma turma, em decisão confusa, havia julgado anteriormente que a ação era improcedente, mas o Ministério Público recorreu e o teor da decisão foi alterado. 

De acordo com Souza Prudente, a paralisação da obra deve ser imediata. Caso a decisão seja descumprida pela Norte Energia – empresa responsável pela construção e operação do empreendimento – uma multa diária de R$ 500 mil será aplicada. A empresa alega que só suspenderá a obra quando for notificada pela Justiça, o que deve acontecer nesta quarta-feira (15), segundo o desembargador. 

“Nós vamos notificar [a empresa] por ofício eletrônico, mas o acórdão ainda deve esperar até a próxima semana, pois precisamos reunir as notas taquigráficas e a partir disso é que começa o prazo para recurso. Mas a multa já passa a valer a partir do momento que a empresa tomar conhecimento da nossa decisão”, afirmou Souza Prudente em entrevista coletiva. 

A paralisação de Belo Monte deve acontecer até que o Congresso Nacional ouça as comunidades indígenas afetadas, fazendo valer seu direito à consulta prévia, livre e informada – o que não foi feito antes da liberação do empreendimento. Os parlamentares terão ainda, segundo o desembargador, que editar um novo decreto legislativo autorizando as obras. 

“Não estamos combatendo o projeto de aceleração do governo. Mas não pode ser um processo ditatorial. O Congresso terá que corrigir seu ato, materialmente viciado. Só queremos garantir os direitos dessas populações”, disse. 

A Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), e a Constituição Federal garantem aos índios o direito de serem ouvidos em empreendimentos que vão afetar seu modo tradicional de vida. No caso de Belo Monte, esse direito foi atropelado. O decreto legislativo nº 788, de 2005, que autoriza a construção da usina, diz que as consultas, assim como o Estudo de Impacto Ambiental – exigido pela legislação para liberação de empreendimentos – poderiam ser realizados após a liberação da obra, caracterizando a primeira falha do processo. 

“Só em um regime de ditadura tudo é póstumo. Não se pode admitir estudos póstumos. A Constituição Federal diz que os estudos têm que ser prévios.” Além disso, disse o desembargador, caso as comunidades resolvam que não querem o empreendimento, a decisão deverá ser considerada pelos parlamentares, o que invalidaria de vez o licenciamento da usina e paralisaria definitivamente a construção da hidrelétrica no Rio Xingu. 

“Eles têm que ter voz ativa nesse processo, pois esse é um direito garantido a eles na Constituição. Esse projeto está sofrendo várias impugnações e vai continuar sofrendo. Não podemos pensar, como já disse o Supremo Tribunal Federal, apenas em aproveitamento financeiro e econômico. Há outros valores de ordem cultural, os direitos fundamentais dessas populações que têm que ser respeitados, como a Constituição e os tratados internacionais dizem. Nem mesmo o parecer da Funai substitui a decisão dos índios”, alega o desembargador. 

Para o procurador Felício Pontes Jr., do Ministério Público Federal do Pará, o decreto legislativo que autorizou Belo Monte sem consultar os índios era uma afronta à Carta Magna. “Finalmente, depois de anos de debates, o Judiciário se pronunciou em defesa da lei maior do País e dos direitos dos povos originários”,disse o procurador, em nota do MPF.

Essa é a única ação na qual houve, até o momento, uma decisão de mérito ligada ao caso. Todas as outras foram provisórias. Todas foram, invariavelmente, cassadas pelo presidente do TRF1, sob o argumento de que a obra é importante para o País e, portanto, o cumprimento da lei é secundário. 

Apesar de ser uma vitória em relação à batalha que se travou no processo atropelado de licenciamento de Belo Monte, ainda cabe recurso. Segundo Souza Prudente, as partes interessadas – Advocacia Geral da União e Norte Energia – podem recorrer tanto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) como ao STF. “O Supremo tem sido categórico em defender os direitos ambientais e indígenas. Nossa esperança é que valide essa decisão”, disse Souza Prudente. 

Para Raul Telles do Valle, coordenador adjunto do Programa de Políticas Públicas do ISA, a revisão feita pelo tribunal em sua própria decisão é muito bem-vinda. “A decisão anterior era vergonhosa. A relatora, Selene de Almeida, proferiu um voto muito consistente e bem fundamentado, reconhecendo que não houve consulta, mas que deveria haver. Os demais juízes, no entanto, discordaram dela, mas sem explicar bem o porquê. Um deles, inclusive, tinha sido advogado da Eletronorte, mas mesmo assim participou do julgamento. Agora, finalmente, uma decisão sem influência política foi tomada". 

Notícia extraída do site www.socioambiental.org

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