terça-feira, 30 de junho de 2009

RAÍZES...


Na época do Império Chimu, às margens do rio Paquisllamga (atualmente chamando de Lambayeque), por volta do ano 1.000, as tradições mencionam a existência de um outro grande povo – os ATUMURUNA –, às margens do Titicaca, cerca de 3.500 metros acima de altura, no meio dos Andes.

Esse povo teria o mesmo que fundou o império Chimu. E por isso a civilização TIAHUANACO, iniciada por eles, têm uma forte influência cultural da civilização Chavin e, ao mesmo tempo, uma indiscutível inovação, tornando-se berço e ponto de partida de uma cultura e um império sem precedentes.

Tiahuanaco foi fundada na margem sul do Lago Titicaca, com suas águas ligeiramente salobras e geladas, formado por cerca de quarenta rios que nascem das geleiras vizinhas, que o cercam. Um lugar inóspito e selvagem; uma planície sem árvores que se estende entre montanhas de neves eternas.

As crônicas de Gregório García, do século XVIII, conta que, segundo as crenças locais, houve um tempo em que a região de Tiahuanaco estava imersa em trevas. Nesse tempo, saiu do grande lago Titicaca, um grande líder chamado KON TICSI WIRACOCHA, que criou, de uma só vez, o Sol e a Lua, e todas as estrelas. Esse herói aparece em todos os relatos variantes da região, apontando Wiracocha como um deus criador que, porém, intervém em um mundo que já existia, mas era desorganizado e obscuro. Ele surge como um clarão fugaz e fosforescente de Titi, o enorme felino de fogo, empoleirado na ponta rochosa que emergia das águas. Portanto, o papel “criador” de Wiracocha é o de transformar a desorganização em cosmos! Tarefa difícil, pois choca-se com a desobediência dos homens.

E acordo com um dos maiores quipucamayoc do fim do império inca, Tiahuanaco foi construída sobre as ruínas da velha Chucura, a antiga capital de um povo “selvagem”, por ordem de um “poderosíssimo senhor” – um soberano pré-incaico. Que Fernando de Montesino identifica como sendo Inti Capac – o Sol-Rei

Tiahuanaco é uma metrópole insólita, cujo complexo arquitetônico cobre cerca de quatrocentos e cinqüenta mil metros quadrados, uns vinte quilômetros a sudeste do lago Titicaca, no coração de um pequeno vale alongado, relativamente estreito, em forma de ferradura. Uma linha convexa, ininterrupta em várias centenas de quilômetros, de sedimentos e fósseis marinhos, indica que o Titicaca se elevara do mar há alguns milhões de anos. A cidade ciclópica foi concebida segundo uma rigorosa orientação astronômica, seguindo o norte geográfico e um sistema meteorológico que condicionou esta orientação. Percebe-se claramente a simetria intencional dos eixos que emanam todos de uma grande pirâmide.

Não conhecemos a extensão exata do que foi o domínio tiahuanaco. A geografia das principais ruínas que lhes são atribuídas pelos arqueólogos, situa a maior parte desse império no território da Bolívia e sul do Peru. Mas isso não exclui que por um sistema de alianças ou de vassalagem, os Atumuruna tenham conseguido estender sua influência bem além de suas fronteiras. Mais audaciosos que os incas, ainda que menos metódicos, eles não hesitaram, parece, em enfrentar as tribos primitivas da floresta virgem e a navegar nos vários afluentes do Amazonas, segundo os estudos de Jaques de Mahieu, confirmados pela arqueologia. “Ainda que o centro da civilização de Tiahuanaco tenha sido sempre situado nas regiões que circundam o Lago Titicaca”, escreve Rafael Karsten, “muitos fatos falam em favor da teoria segundo a qual ela teve uma extensão bem maior. As escavações arqueológicas ao sul da Bolívia e do distrito de Cochabamba, à beira da floresta virgem, trouxeram cerâmicas leves do gênero de Tiahuanaco. Da mesma forma, vasos pintados no mesmo estilo foram encontrados em toda a costa, de Trujillo a Nazca. A única explicação possível é que os tiahuanacos estenderam outrora seu domínio até o oceano e que os povos subjugados adotaram a arte e o estilo de seus conquistadores. No norte, igualmente, como o demonstram achados arqueológicos, esta civilização estendeu-se em um certo momento até o Equador meridional”. As tradições aymarás falam que Wiracocha marchou à frente de seus exércitos até o Equador, ao norte, até o Chile, ao sul, penetrando, a leste, nas planícies da Amazônia e do Paraguai.

Jacques de Mahieu situa a queda do império Tiahuanaco por volta das últimas décadas do século XIII. As circunstâncias deste desastre não são muito claras mas sabemos que um povo vindo do norte do Chile, comandados por um curaca (líder) chamado Cari, travou várias batalhas com as tribos leais ao império. Algumas notícias colhidas por Gregório García, sem suas crônicas, no Equador, falam que um “Ser” vindo do norte, chamado KON, que foi vencido e expulso por uma divindade mais poderosa chamada PACHACAMAC.

As tradições contam, no entanto, que nem todos os sobreviventes das batalhas fugiram pelo mar. Um grupo teria se escondido por anos nas montanhas ao norte do lago Titicaca. Vários relatos sobre os antecedentes familiares do fundador da dinastia incaica – Manco Capac – estabelecem com quase certeza absoluta a filiação entre os Atumuruna e os Incas. Uma prova tangível é oferecida por algumas múmias escondidas em Cuzco, encontradas por Juan Pólo de Ongardo alguns anos após a conquista espanhola. Seus traços são impressionantemente tiahuanacotas.

Um segundo grupo de refugiados de Tiahuanaco foi descoberto na floresta tropical do noroeste paraguaio, nos limites da atual Bolívia, por Jacques de Mahieu – que estudou os índios guaranis de Cerro Moroti. As minuciosas investigações apontam para a conclusão de que o antigo caminho que liga a região de Tiahuanaco à região central do Paraguai (onde, atualmente, está Assumpção) fora a única salvação daqueles fugitivos, apressados pelo tempo e perseguidos pelas tropas de Cari.

Os contatos entre o planalto boliviano e o Paraguai foram, sem dúvida, mais numerosos e mais intensos do que se acreditava até pouco tempo. O coronel Fawcett escreveu, em 1924, que “os índios mantêm ainda a tradição homens que chegaram no Paraguai, descendentes de um povo que tinha colonizado a região”. No final do século XVI, os guaranis paraguaios informa aos espanhóis que eram descendentes de um império Grand Moxo, situado a noroeste, cuja capital estava situada numa ilha no meio de um lago imenso. Interessante é que esses guaranis conheciam metais que não trabalhavam: ouro (cuarepotyyu), prata (cuarepotytin) e cobre (cuarepotyné) – os metais do planalto andino. Podemos então afirmar que os ancestrais dos guaranis são os Atumuruna, instalados em algumas praças fortes paraguaias, que a derrocada do império de Tiahuanaco impediu de voltar à sua base de partida... e que se transformaram em “caminheiros” (‘mbiá, na lingua guarani) à procura da Terra sem Males que fica à margem da “grande água”.


Baseado no texto “A Civilização Inca”, de Jean-Claude Valla

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